segunda-feira, outubro 27, 2008

A beleza das simetrias

Quando andava a estudar o comportamento dos pavões, durante o meu mestrado em Etologia, verifiquei que aos pavões que eu e os meus colegas de investigação achávamos mais bonitos (mais belos) eram também os mais procurados pelas fêmeas e que, como consequência, acasalavam mais vezes.

Eu e as pavoas valorizávamos, por certo, alguma coisa em comum. Elas pretendiam acasalar com um macho de qualidade; eu pretendia descobrir a razão das suas preferências (
que, por acaso (???) coincidiam com as minhas preferências de beleza animal). Para não haver um enviesamento dos resultados, medimos dados muito objectivos. No final da investigação, além de outras coisas, verificámos que os pavões mais escolhidos pelas fêmeas eram os mais simétricos!

Na altura comecei a pensar se existiria também, na nossa espécie, alguma relação entre a simetria do nosso corpo e a atracção sexual. Procurei e encontrei investigação nesta área que mostra que assim é.

Simetria e beleza! Haverá alguma ligação?

Existem muitos exemplos no reino animal de preferência na escolha de um parceiro sexual baseado na sua simetria - para dar apenas dois exemplos, temos insectos, como por exemplo as moscas escorpião (
Mecoptera) e aves, como por exemplo a andorinha (Passeriformes, Hirundinidae) cujos machos preferem acasalar com fêmeas com asas de igual tamanho, evitando as fêmeas com asas desiguais.

É um assunto interessante e talvez não seja por acaso que a natureza, criou formas vivas e não vivas, baseadas num plano de simetria. Vejamos alguns exemplos: cristais, virus, bactérias, ouriços-do-mar, borboletas, moscas, aranhas, passarinhos, homens, …, uns com simetria bilateral, outros com simetria radial.

Existem estudos muito interessantes sobre este assunto. Um, por exemplo, relaciona a simetria humana facial e corporal com os julgamentos da sua atractividade (faces e corpos simétricos são considerados mais atractivos) e mostra que as agressões ambientais produzem assimetrias durante o desenvolvimento, agressões essas que incluem, nomeadamente, prevalência de parasitas que habitam o corpo humano, mutações e toxinas.

Uma vez que as assimetrias físicas, ou seja, desvios da simetria bilateral, revelam uma incapacidade em resistir aos efeitos nocivos de perturbações durante o desenvolvimento, o grau de assimetria pode ser usado como pista para determinar o estado de saúde do indivíduo e também como um índice do grau segundo o qual o desenvolvimento desse indivíduo foi afectado por agentes causadores de stress.

Um outro estudo interessante, usou o computador para criar várias faces a partir da sobreposição de 4, 8, 16 e 32 faces verdadeiras, originando assim “faces compostas”. Estas faces foram apresentadas a pessoas, juntamente com faces não modificadas e foi-lhes pedido para as ordenarem da mais atractiva para a menos atractiva. E o resultado foi o seguinte: as faces compostas foram uniformemente julgadas fisicamente mais atractivas do que qualquer face individual. A face formada pela sobreposição de 16 faces foi considerada mais atractiva que as formadas por 4 e 8 faces, sendo a face formada pela sobreposição de 32 faces aquela que foi considerada a mais atractiva de todas. Uma vez que a sobreposição das faces tende a eliminar as irregularidades e a torná-la mais simétrica, então, a razão da escolha pode ser as faces simétricas serem mais atractivas.

Os psicólogos evolucionistas sugerem que as nossas preferências pela simetria podem ser explicadas no contexto da escolha de um parceiro sexual porque a simetria representa um indicador honesto da qualidade genética de um potencial parceiro sexual. Segundo a teoria dos "bons genes" da selecção sexual, os indivíduos evoluíram as suas preferências sexuais por parceiros que possuem características físicas que dão indicações relativas aos genes que aumentam o vigor e a viabilidade dos filhos.

Será que tudo tem a ver com sexo? Até a noção de belo? É uma ideia recorrente que me acompanha há já algum tempo.

E sexo e poder? Não há dúvida.

As nossas escolhas nos políticos em quem votamos obedecem também ( de certo modo e inconscientemente) a este julgamento da simetria facial?


Pergunta tola: Quem ganhará as eleições americanas?


Consultas:
Gangestad, S. W., Thornhill, R., & Yeo, R. A. (1994). Facial atractiveness, developmental stability, and fluctuating asymetry.
Ethology and Sociobiology, 15, 73-85.
Langlois, J. H., & Roggman, L. A. (1990). Attractive faces are only average. Psychological Science, 1, 115-121.
Schackelford, T. K., & Larsen, R. J. (1997). Facial assymmetry as indicator of psychological, emotional, and physiological distress. Journal of Personality and Social Psychology, 72, 456-466.
Fotografias retiradas daqui, daqui e daqui

quinta-feira, outubro 09, 2008

Mulheres atraentes


Estou constantemente a ver na televisão e nos media, em geral, mensagens explícitas e implícitas acerca do corpo perfeito, atraente e saudável. Para vender um carro, um seguro ou qualquer outra coisa, associa-se a imagem de uma mulher, atraente, jovem, em posições corporais de índole sexual. Para vender uma revista de electrónica, enfia-se na capa uma mulher semi-nua, provocante. Assim, vende-se.

O que é para os homens ser uma mulher atraente? Ter uma cara bonita? Ter um corpo bonito, perfeito, com “curvas”?
Será que todas as culturas valorizam as mesmas características no corpo de uma mulher?
O corpo das modelos corresponde ao corpo perfeito?
Existe alguma coisa no nosso passado evolutivo que nos leva a valorizar o corpo das mulheres?

São muitas perguntas que estão, do meu ponto de vista, todas relacionadas.


Os standards de atractatibilidade corporal de uma mulher variam de cultura para cultura. Por exemplo, nas culturas em que o alimento é escasso um corpo mais gordinho mostra sinais de saúde e de nutrição, enquanto que nas sociedades em que o alimento é relativamente abundante a relação entre a gordura e o estatuto está invertida, sendo um corpo magro sinal de saúde.

A preferência em relação ao tamanho do corpo varia de cultura para cultura, mas existe uma preferência pela forma do corpo, que é única e universal e que tem a ver com a relação entre a medida da cintura e a medida das ancas.

Sabemos que antes da puberdade, rapazes e raparigas apresentam, uma distribuição semelhante da gordura corporal, mas na altura da puberdade acontecem mudanças drásticas nesta distribuição: os rapazes perdem a gordura das nádegas e das coxas enquanto que as raparigas ganham depósitos de gordura exactamente nas coxas e nas ancas, atingindo nessas zonas um volume 40% maior do que nos homens.


A razão entre a medida da cintura e a medida das ancas (vou abreviar para RCA) é semelhante em ambos os géneros, antes da puberdade, variando entre 0,85 e 0,95. Contudo, depois da puberdade o depósito da gordura nas coxas e nas ancas das raparigas faz com que a sua RCA se torne significativamente mais pequena em comparação com os homens. Assim, as mulheres com capacidade reprodutora apresentam uma RCA entre 0,67 e 0,80 enquanto que os homens mantêm uma RCA entre 0,85 e 0,95.


O que tem isto a ver com atracção?


Algumas experiências actuais mostram que os homens preferem as figuras femininas médias (nem gordas nem magras) mas, uma coisa é certa, independentemente de serem mais magras ou mais gordas, os homens acham as mulheres com baixa RCA, mais atraentes. As mulheres com uma RCA de 0,70 são consideradas mais atraentes que as que possuem uma RCA de 0,80, e estas, por sua vez, mais atraentes que as mulheres com uma RCA de 0,90.


Existe um estudo interessante que se debruçou na análise das mulheres fotografadas nas páginas centrais da revista Playboy e das vencedoras dos concursos de beleza nos E.U. a partir da década de 70 que confirma a regra da preferência dos homens por mulheres com uma RCA baixa. Apesar das mulheres terem vindo a se tornar mais magras, as suas RCAs mantêm-se exactamente as mesmas: 0,70. É a célebre “forma de violino”.


A investigação científica apresenta evidências abundantes que indicam constituir a RCA um indicador fiável do estatuto reprodutor de uma mulher. Por exemplo, as mulheres com uma RCA mais baixa apresentam uma actividade endócrina pubertária mais precoce e engravidam mais facilmente e as mulheres com uma RCA mais alta mostram uma maior dificuldade em engravidar e quando engravidam fazem-no com uma idade mais avançada em relação às mulheres com RCAs mais baixas. Além dissso a RCA constitui também um bom indicador da previsão a longo prazo da condição de saúde de uma mulher. Doenças como a diabetes, hipertensão, ataque cardíaco, trombose, doenças da bexiga, têm sido ligadas à distribuição da gordura corporal e não propriamente à sua quantidade total.


Sendo assim, a ligação entre a RCA e saúde e estatuto reprodutor, deve ter constituído uma pista forte e fiável para os homens ancestrais na “escolha” de uma parceira sexual, desenvolvendo-se, ao longo das gerações a preferência pelas mulheres que exibiam baixas RCAs. Os homens que falhassem esta avaliação, teriam menos filhos e, eventualmente, a sua linha genética, desapareceria.


Provavelmente esta foi uma das formas que a natureza achou para perpetuar a espécie: “inventar” a atracção sexual como forma anticipada de prazer sexual.


A propósito: a minha RCA é 0,76. Para 58 anos anos não está mal!


Consultas:
Singh, D. (1993). Adaptative significance of waist-to-hip ratio on judgments of women's
attractiveness. Journal of Personality and Social Psychology, 65, 293-307.
Singh, D., & Young, R. K. (1995). Body weight, waist-to-hip ratios, breasts and hips: Role in judgments of female attractiveness and desirability for relationships. Ethology and Sociobiology, 16, 483-507.
Fotografia retirada daqui