Ter febre, é bom ou mau?
No fim-de-semana que passou, o meu neto apareceu com febre – sinal que estava doente. Acontece com a maior parte das crianças, aparecerem com febre, sem mais nem menos. Pensamos logo: deve ser uma virose, amigdalite, ou até, alguma dessas doenças infantis. Já se percebeu que gosto de “pegar” em factos do quotidiano, para, a partir deles, perceber a razão de tal acontecimento, tendo como pano de fundo, como linha orientadora, o nosso percurso evolutivo sobre este planeta. Ter febre, é bom ou é mau?
Quando a febre aparece e se consulta o médico (ou médica), o mais provável é que receite um antipirético, que pode ser ácido acetilsalicílico (aspirina), paracetamol ou iboprufeno, com a recomendação de manter a febre abaixo dos 38ºC e esperar 3 dias antes de se passar a outras soluções. A verdade é que estas drogas que reduzem a febre podem prolongar a doença conforme dados relativamente recentes. Assim como a humanidade tem sido bombardeada com inúmeras doenças ao longo do tempo em que tem passado aqui na Terra, também tem desenvolvido muitos meios de as combater: a febre constitui um desses mecanismos naturais contra a doença.
Não é só o homem que precisa da febre para combater a doença - um exemplo interessante é dado pelos lagartos que quando estão com uma infecção, procuram uma pedra quente para se aquecerem e assim aumentarem a sua temperatura corporal. Esta subida de temperatura combaterá a infecção. Os lagartos que não conseguirem encontrar uma pedra quente provavelmente morrerão.
Os lagartos têm aquele comportamento (as nossas lagartixas incluídas) porque são animais de sangue frio e não conseguem produzir calor nem regular a sua temperatura corporal. Os mamíferos (como nós) e as aves, conseguem regular a sua temperatura corporal pois são capazes de produzir calor e regular essa produção de calor, consoante a necessidade. Em resposta à infecção, o nosso organismo fica mais quente, fica com febre, o que é importante por duas razões: 1- as nossas enzimas responsáveis pela destruição dos microorganismos que causam essa infecção funcionam melhor a uma temperatura superior a 38ºC; 2- as substâncias tóxicas produzidas pelos microorganismos têm um efeito mais acentuado a temperaturas inferiores a 38ºC. Se a febre for muito alta torna-se perigosa ou mesmo fatal, mas se a febre mantiver a temperatura corporal à volta de 38°C ou 39°C, acaba por ser benéfica para a saúde.
Um outro exemplo interessante, data do início do séc. XX e foi conhecido através das observações do médico Julian Wagner-Jauregg quando verificou que a sífilis era raramente vista nos locais onde a malária era comum. Nessa altura a sífilis matava 99% das pessoas infectadas! Wagner-Jauregg infectou propositadamente algumas pessoas com malária, produzindo febre alta e verificou que 30% dos doentes sobreviveram, o que representou um ganho extraordinário numa doença que matava 99% dos infectados. Parece que a febre proveniente da malária aparentemente curou a sífilis.
Mais recentemente um estudo verificou que as crianças infectadas com varicela e tratadas com acetominofen levaram um dia a mais para se curarem do que as não foram tratadas. Num outro estudo infectaram-se propositadamente pessoas com um tipo de vírus da gripe ministrando posteriormente a metade delas um antipirético e à outra metade um placebo; as pessoas que receberam o antipirético apresentaram um maior congestionamento nasal, uma pior resposta em anticorpos e um período ligeiramente maior de doença.
Ao mesmo tempo que a febre aumenta, diminui a quantidade de ferro no organismo e esta também parece ser uma resposta evolutiva à presença de microorganismos que causam infecções. As bactérias alimentam-se de ferro, proliferando. Quando uma pessoa fica infectada o corpo produz uma substância química mediadora que reduz a quantidade de ferro no sangue. Ao mesmo tempo as pessoas reduzem espontaneamente a ingestão de alimentos ricos em ferro e o corpo reduz a absorção de ferro no intestino. Os humanos aparentemente desenvolveram mecanismos para porem as bactérias a passar fome e assim combaterem a doença rapidamente.
Quando estamos a ingerir suplementos de ferro (e por vezes até nem temos necessidade disso) estamos a interferir com o processo natural de combater as infecções. Para combater a falta de ferro estamos a aumentar a taxa de infecções.
Será que os médicos sabem disto?
Em suma, os humanos, ao longo da evolução, entraram numa corrida armada com os micróbios, desenvolvendo mecanismos para os combater; os micróbios, por sua vez, também desenvolveram soluções contra as nossas armas e nós desenvolvemos respostas a essas soluções e assim entramos numa corrida armada que dura até aos nossos dias e que persistirirá enquanto houver homens.
A propósito: o meu neto tomou um antipirético. Como o médico mandou!
Quando a febre aparece e se consulta o médico (ou médica), o mais provável é que receite um antipirético, que pode ser ácido acetilsalicílico (aspirina), paracetamol ou iboprufeno, com a recomendação de manter a febre abaixo dos 38ºC e esperar 3 dias antes de se passar a outras soluções. A verdade é que estas drogas que reduzem a febre podem prolongar a doença conforme dados relativamente recentes. Assim como a humanidade tem sido bombardeada com inúmeras doenças ao longo do tempo em que tem passado aqui na Terra, também tem desenvolvido muitos meios de as combater: a febre constitui um desses mecanismos naturais contra a doença.
Não é só o homem que precisa da febre para combater a doença - um exemplo interessante é dado pelos lagartos que quando estão com uma infecção, procuram uma pedra quente para se aquecerem e assim aumentarem a sua temperatura corporal. Esta subida de temperatura combaterá a infecção. Os lagartos que não conseguirem encontrar uma pedra quente provavelmente morrerão.
Os lagartos têm aquele comportamento (as nossas lagartixas incluídas) porque são animais de sangue frio e não conseguem produzir calor nem regular a sua temperatura corporal. Os mamíferos (como nós) e as aves, conseguem regular a sua temperatura corporal pois são capazes de produzir calor e regular essa produção de calor, consoante a necessidade. Em resposta à infecção, o nosso organismo fica mais quente, fica com febre, o que é importante por duas razões: 1- as nossas enzimas responsáveis pela destruição dos microorganismos que causam essa infecção funcionam melhor a uma temperatura superior a 38ºC; 2- as substâncias tóxicas produzidas pelos microorganismos têm um efeito mais acentuado a temperaturas inferiores a 38ºC. Se a febre for muito alta torna-se perigosa ou mesmo fatal, mas se a febre mantiver a temperatura corporal à volta de 38°C ou 39°C, acaba por ser benéfica para a saúde.
Um outro exemplo interessante, data do início do séc. XX e foi conhecido através das observações do médico Julian Wagner-Jauregg quando verificou que a sífilis era raramente vista nos locais onde a malária era comum. Nessa altura a sífilis matava 99% das pessoas infectadas! Wagner-Jauregg infectou propositadamente algumas pessoas com malária, produzindo febre alta e verificou que 30% dos doentes sobreviveram, o que representou um ganho extraordinário numa doença que matava 99% dos infectados. Parece que a febre proveniente da malária aparentemente curou a sífilis.
Mais recentemente um estudo verificou que as crianças infectadas com varicela e tratadas com acetominofen levaram um dia a mais para se curarem do que as não foram tratadas. Num outro estudo infectaram-se propositadamente pessoas com um tipo de vírus da gripe ministrando posteriormente a metade delas um antipirético e à outra metade um placebo; as pessoas que receberam o antipirético apresentaram um maior congestionamento nasal, uma pior resposta em anticorpos e um período ligeiramente maior de doença.
Ao mesmo tempo que a febre aumenta, diminui a quantidade de ferro no organismo e esta também parece ser uma resposta evolutiva à presença de microorganismos que causam infecções. As bactérias alimentam-se de ferro, proliferando. Quando uma pessoa fica infectada o corpo produz uma substância química mediadora que reduz a quantidade de ferro no sangue. Ao mesmo tempo as pessoas reduzem espontaneamente a ingestão de alimentos ricos em ferro e o corpo reduz a absorção de ferro no intestino. Os humanos aparentemente desenvolveram mecanismos para porem as bactérias a passar fome e assim combaterem a doença rapidamente.
Quando estamos a ingerir suplementos de ferro (e por vezes até nem temos necessidade disso) estamos a interferir com o processo natural de combater as infecções. Para combater a falta de ferro estamos a aumentar a taxa de infecções.
Será que os médicos sabem disto?
Em suma, os humanos, ao longo da evolução, entraram numa corrida armada com os micróbios, desenvolvendo mecanismos para os combater; os micróbios, por sua vez, também desenvolveram soluções contra as nossas armas e nós desenvolvemos respostas a essas soluções e assim entramos numa corrida armada que dura até aos nossos dias e que persistirirá enquanto houver homens.
A propósito: o meu neto tomou um antipirético. Como o médico mandou!
Consultas:
Kluger, M. J. (1991). The adaptative value of fever. In P.A. MacKowiac (Ed.), Fever: Basic measurement and management (105-124), New York:Raven Press.
Nesse, R. M., & Williams, G. C. (1994). Why we get sick. New York Times Book Random House.
Doran, T.F. et al. (1989). Journal of Pediatrics, 114, 1045-1048.
Graham, N. M., et al. (1990). Journal of Infectious Diseases, 162, 1277-1282.
9 Comentários:
Bom tema, sim senhor, ainda bem que vou encontrando alguem da minha idade hehe Gosto e voltarei ao teu blog. bj
02/04/2008, 17:52:00
Eu quando tenho 38ºC ou 39ºC raramente tomo algo, contudo quando cheguei ao hospital e a minha urina era sangue e a temperatura 39ºC... Foi feito logo uma data de exames para se perceber que tinha pedras nos rins... Ainda bem que aconteceu na Irlanda porque curaram-me e operaram rapidamente!
A temperatura passando esses 39ºC desnatura as proteínas e faz com que a pessoa morra... Penso que deve ser algo muito doloroso...
03/04/2008, 23:22:00
Muito interessante. Fiquei a saber um pouco mais e como gosto de aprender...
Bom fim de semana.
04/04/2008, 17:11:00
Por acaso também penso que a febre é o corpo a trabalhar apra combater algo... Mas o médico manda tomar o anti-pirético...
Eu prefiro anti-inflamatório, nem sei se estou a fazer bem...
Beijos
04/04/2008, 23:04:00
Temos por aqui, alguns pediatras que mantêm uma lista de crianças, desde que nasceram (sem tomar antibioticos e analgesicos)sendo as suas proprias defesas que resolvem o problema , quando é possivel claro.
07/04/2008, 05:47:00
Chego aqui e aprendo logo alguma coisa de útil. Também não tento interferir na febre quando percebo a razão da sua existência. Esta última semana passei-a com uma gripe danada que me dava febres na ordem dos 39º e dores horríveis no corpo todo. O médico receitou-me Brufen que nem sequer aviei. Passei a tomar muitos sumos de laranja, maçã, cenoura, naturais, duches com água morna mais para o frio. Sabia que a gripe não sairia antes de uns 4 dias e por isso não me alarmei. Hoje já me sinto bem embora acompanhada por uma tosse chata.
Mas no ano passado em que também fui á cama com febre, não me apercebi que tendo uma febre fixa, sem subir muito nem descer que poderia ser sinal de qualquer coisa diferente de uma gripe. Quando me fizeram o Rx é que me dei conta da pneumonia que andava a chocar há alguns dias. Por isso digo sempre que é preciso ter cuidado, pedir uma opinião médica para não se incorrer em erros graves.
Tal como dizes, também acho que não deve haver uma grande preocupação em baixar a febre quando esta não está acima dos 39º. Mas quando vai para valores mais altos, há que actuar rapidamente. Eu sou do tempo que em que se davam clisteres às crianças para baixar a febre.
Outros tempos, outras terapias :)))))))
Obrigada pela informação.
Beijinhos
08/04/2008, 21:35:00
Muito interessante este vosso artigo, ilustre pedagoga.
Sempre a ensinar; ainda bem pois eu aprendo com gosto.
No tocante a febre, mais uma vez deverá ter alguma razão, atendendo a que, de quando em vez, me aparece a tal febre de 39° mas que passa sem grandes maleitas, umas mézinhas, uns cházinhos e já está novo, mas se andar perto dos 39,5°, a coisa muda de figura, tem de ser mesmo antibiótico e antipirético, em doses de cavalo para domar o febrão.
22/05/2008, 12:12:00
Muito interessante sua coletania de informacoes.
Ja peguei gripe e resfriado com febre, em que somente comecei a melhorar apos algumas horas de febre continua, um bom cobertor e uma boa dormida. Imagino q a febre e' benefica conquanto permanecer em niveis abaixo de 39.5-40 graus.
Seus comentarios vieram a enfatizar minhas observacoes.
Saudacoes
18/06/2008, 23:39:00
Uma jovem mãe está preocupada com a febre de seu filho.Qual o motivo da preocupação desta mãe, caso a temperatura atinja 43°C?
Se alguém souber a resposta por favor me diga! =)
24/06/2008, 20:17:00
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